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Como agir caso você se apaixone por um(a) interagente durante o processo terapêutico?, por Julio Zorba

“Quem irá dizer que existe razão nas coisas feitas pelo Coração?
E quem irá dizer que não existe razão?”
Renato Russo

É possível que você já tenha se deparado com essa pergunta ao menos uma vez em sua trajetória profissional, seja por experiência própria ou por haver compartilhado de um relato próximo ou por acompanhar uma bela história de amor. A questão não é julgar ou trazer considerações das razões e fatores objetivos ou subjetivos, conscientes ou inconscientes, que podem nos colocar diante de tal situação, mas sim de trazer elementos que nos façam refletir sobre o tema à luz do que dispõe o recém aprovado Código de Conduta Profissional de Terapeutas Tântricas e Tântricos, da ABRATANTRA.

De saída, é preciso considerar duas premissas elementares: a primeira de que tratamos especificamente de uma das dimensões de atuação que é o atendimento individual ou de casal, que difere na sua abordagem e abrangência terapêutica da atuação com os trabalhos em grupos e cursos e da atuação com processos formativos de terapeutas. Não há, na mesma medida, constrangimento de um envolvimento amoroso nas duas últimas dimensões de nossa atuação profissional, quais sejam, trabalhos em grupos e processos formativos. O ponto aqui é resguardar que, a exemplo dos atendimentos, isso não se dê de forma intencional e premeditada, podendo valer-se de um estado de vulnerabilidade de participantes ou alunas(os) em formação. Isso evidentemente remontaria ao nosso entendimento acerca das relações abusivas e inaceitáveis entre as(os) terapeutas. Vários de nós compartilhamos vivências com nossas(os) companheiras(os), namoradas(os) ou parceiras(os) sexuais e, parece-me até natural e saudável que um relacionamento onde um ou ambos conhecem e vivenciam o Tantra que existam esses pontos de encontro.

A segunda premissa, de que a(o) terapeuta não pode ter como disposição e/ou intenção se envolver amorosamente ao conduzir um processo terapêutico. Ao fazê-lo intencionalmente estaria comprometendo ao menos dois princípios fundamentais, de manter a neutralidade na atuação como terapeuta e de sustentar a distância terapêutica em relação à(ao) interagente, conforme dispõe o Código no Art. 10, incisos IV e V. Ao dar a esses dois aspectos a qualidade de princípio fundamental, nosso Código procura ser claro e contundente do quanto o processo de condução terapêutica pode tornar-se ineficaz e não ser efetivo no seu propósito.

O processo terapêutico é individual e personalíssimo. Ao se entregar a ele a(o) interagente se mostra em toda a sua força e vulnerabilidade e acessa dimensões de sua vida com as quais pode nunca ter tido contato ou consciência. A terapêutica tântrica, sabemos, permite-nos um mergulho em nossa própria essência interior e, ao fazê-lo encontramos luz e sombras, riso e dor. É um processo que requer autonomia, espontaneidade, liberdade e um tipo de entrega que não admite filtros ou apego. A(o) interagente precisa estar inteiro na experiência.

Como poderíamos, nessa perspectiva, atuar como terapeutas, assumindo um papel ativo na condução do processo e no manejo de um conjunto de abordagens e técnicas terapêuticas, num ambiente em que houvesse intimidade, apego, envolvimento sexual ou amoroso?

Até inconscientemente, e, portanto, não há por que supor que alguém faria por dolo ou má-fé, poderíamos assumir um lugar que comprometesse nossa legitimidade como profissionais. Não haveria como evitar processos de contratransferência ou mesmo o risco de uso de estratégias de persuasão psicológica e/ou emocional em favor de nossos paradigmas, crenças e juízos.

O atendimento em sessões de terapia tântrica individual e/ou casal é entendido como um conjunto de ações, um processo e/ou método específico, desenvolvido pela(o) terapeuta tântrica ou tântrico em conjunto com a(o) interagente ou com o casal, a fim de promover saúde, autonomia, bem-estar, autoconhecimento, desenvolvimento pessoal e desenvolvimento humano. A(o) interagente é responsável pelo seu processo pessoal, podendo ser corporal, energético ou psicoemocional, é ela(e) quem irá vivenciar a experiência, quem sinalizará os limites, quem atenderá ou não as orientações da(o) terapeuta durante todo seu processo e isso é incompatível com uma postura em que não haja mais neutralidade, impessoalidade e distanciamento terapêutico.

A condução de atendimentos individuais e/ou de casais em sessões de terapia tântrica não pode se iniciar e precisa ser imediatamente interrompido caso haja ou tenha se estabelecido qualquer intenção, disposição ou vínculo amoroso e/ou sexual entre terapeuta e interagente. E, como dito, a questão não é julgar ou trazer considerações das razões e fatores objetivos ou subjetivos, conscientes ou inconscientes que podem nos colocar diante de tal situação.

O objetivo é, de um lado, preservar e valorizar o processo terapêutico, não expondo a(o) interagente e a(o) terapeuta a qualquer constrangimento e/ou limites, e de outro, delimitar de maneira clara que o atendimento com terapia tântrica não pode admitir a interação sexual entre terapeuta e interagente.

Vejamos, como poderiam as pessoas envolvidas manterem neutralidade em um processo catártico ou de mergulho em traumas, dores e vazios existenciais? É crível supor que tenderíamos a interferir para proteger, preservar e acolher a(o) parceiro em suas dores. Da mesma forma, como a(o) interagente agiria se em seu mergulho se tornassem evidentes verdades que poderiam nos desestabilizar ou causar sofrimento? É crível supor que isso poderia criar zonas de silêncio, resistência e contenção.

Por onde quer que se olhe, se acreditamos no alcance e na profundidade que a terapia tântrica pode ter, o processo terapêutico estará inviabilizado quando neutralidade, impessoalidade e distanciamento estiverem comprometidos.

Caberá à(ao) terapeuta – consciente de seu papel – e à(ao) interagente tratarem de forma aberta e transparente, com uma comunicação clara de todos os aspectos envolvidos, e desfazer o vínculo como terapeuta, indicando que, caso queira dar continuidade ao processo, deverá procurar um(a) outro(a) profissional.

Longe de parecer frio ou calculista, vejo como uma inequívoca declaração de afeto, respeito e amor. Uma demonstração do quanto valorizamos o processo terapêutico e a liberdade individual e a autonomia na jornada pelo autoconhecimento e expansão da consciência do Ser.

É preciso olhar atento, vigilância e consciência para não dar margem à uma postura inadequada, deliberadamente descomprometida com a condução do processo terapêutico de qualquer pessoa que nos procura como profissionais. E, mesmo à despeito da imprevisibilidade e das reais possibilidade de um envolvimento afetivo involuntário por pessoas que iniciaram uma terapia juntos, isso não pode encobrir atitudes manipuladoras, abusivas e recorrentes de terapeutas que possam se valer da condição de subjetiva superioridade no contexto da terapia para se aproximar e seduzir a(o) interagente. Ao admitir que ocorrendo o envolvimento o processo deve ser suspenso, não podemos supor que isso se transforme em um caminho fácil para justificar e/ou minimizar tais atitudes. Infelizmente, isso não é ficção, ao contrário, é uma das posturas que a ABRATANTRA espera coibir!


Você concorda com essas reflexões?

Julio Filgueira – Deepak Zorba – Coordenador Geral da ABRATANTRA

Blog: www.megustaeltantra.com

3 respostas

  1. Concordo plenamente
    Primeiramente o Terapeuta deve estar de pleno preparo para controlar e evitar tal aproximação de contatos fisicos alem dos quais de pratica ja aprendidas durante o processo de formação. Caso o Interagente vier a se aproximar de contatos fisicos ;o Terapeuta deverá ser severo em interromper o processo. Como esta quetão tambem pode ser inevitavel por parte do Terapeuta ;é preciso ter a maturidade de que caso venha ocorrer esta identificação de se apaixonarem ,realmente é importantissimo interromper o processo Terapeutico.Porque caso se der continuidade o Interagente poderá interpretar que o processo Tantrico permite essa postura , com isso podemos perder a Credibilidade

  2. Uns dos casos: Já teve casal que me fez uma proposta de atendê-los juntos, sendo que já saquei qual eram a deles, “realizar fetiches”, as pessoas tem confundindo a Massagem Tântrica com swing, não sabem diferenciar isso, e cada dia mais amo meu trabalho de mostrar que as coisas são bem diferentes….

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